sexta-feira, 25 de julho de 2008

Dividir para Unir - Parte VI

A Realidade

                             Realidade é tudo o que existe. É a “Existência”. É o universo material, energético e vivente. É o universo químico, físico e biológico. Comparando, a Verdade é a “Essência”, e a Realidade é a “Existência”. A Verdade é a transcendência, e a Realidade é a imanência. A Verdade é o Ser, e a Realidade é o Existir. A Verdade é imutável, e a Realidade está em constante mutação. Tudo que existe um “dia” deixará de existir. Tudo que é matéria se deteriora e se transforma. Tudo que é energia desvanece e se transfere. Tudo que é “vivo” morre. Tudo isso é Realidade. É ilusão. É mutação. Nada disso é eterno. O que “É”, no entanto, nunca deixa de “Ser”, e o que é “Vida” nunca morre, é eterno, não sujeito a vicissitudes.

                             A Realidade é uma ilusão, pois é efêmera e perece. A verdade não é ilusão, pois é eterna e permanece. Ao plano da Realidade pertencem todas as coisas criadas, toda a criação, todo o universo cósmico em mutação e evolução, toda a matéria e energia, todos os seres viventes. Tudo isso é Real. Tudo isso existe. Mas nada disso “É”. Nada disso é Verdadeiro. A Verdade não se confunde com a Realidade, embora a Verdade esteja presente em toda a Realidade. A Realidade não é a Verdade, embora só possa existir dentro dela e sem fugir dela. A Realidade é tudo, e a Verdade está em tudo (manifestadamente falando). A Realidade é a manifestação da Verdade em suas mais variadas formas, mas não é a Verdade em si. Apenas a Verdade É em si. A Realidade provém da Verdade, assim como a existência só surge a partir da essência, assim como a matéria provém do espírito. O espírito não é a matéria, mas está na matéria (e a matéria nele). A essência não é a existência, mas está na existência (e a existência nela). Diferente do que diz a primitiva crença panteísta, a Verdade não é a Realidade, mas a Verdade está na Realidade (e a Realidade nela).

                             Tudo o que existe provém do Ser e, quando deixa de existir, volta ao Ser. Toda a matéria provém da essência, é formada pela essência, não é a essência em si, mas, quando deixa de existir, volta à essência. Tudo que há na Realidade só existe porque encontra sua mais remota e profunda fonte, direta ou indiretamente, na essência da Verdade.

                             O Ser não existe nem é vivo, pois tudo que existe, deixa de existir, e tudo que é vivo morre. O Ser é “Vida”, mas não um “ser vivo”. O Ser não “existe”, Ele “é”. A existência não “é”, ela “existe”. A Verdade e a Realidade estão sempre juntas, mas eternamente separadas. Uma está na outra, mas uma não é a outra. O Criador não é a criatura, mas criador está na criatura. A criatura não é o criador, mas a criatura está no Criador. Deus não é o homem, mas Deus está no homem. O homem não é Deus, mas o homem está em Deus. A verdade não “existe”, a Verdade “é”. Deus não é aquele que existe, mas aquele que é. A Verdade (Deus) é o Alfa e o Ômega, o princípio e o fim, pois está fora do plano temporal, está na eternidade. É, no entanto, as demais letras, pois está também dentro do plano temporal e da existência, está nas mutações e nas evoluções. Deus é tanto a transcendência quanto a imanência. Está tanto dentro quanto fora. Está na Realidade, e a Realidade está Nele. Está fora da Realidade, e sua essência é a infinita fonte imortal. Está no tempo, e o tempo está nele. Está fora do tempo, e sua essência é o eterno momento único, o momento presente. É o tudo em todos e de todos. Não há como fugir de Deus ou da Verdade, pois, ainda que a toda a Realidade (a matéria, a energia, os seres vivos, o tempo, o cosmos e tudo o mais) deixe de existir, a Verdade permanece. De fato, só Ela restará. É sempre o princípio e o fim de tudo. Sempre a fonte e a entropia de todos. Sempre a essência e a decadência da Realidade. Porquanto, subsistem dois dos três planos do “Todo”: O plano da “Verdade” e o plano da “Realidade”. Este é ilusão, aquele é eterno.

               Por que convencionei chamar o plano da ilusão de Realidade? Por um motivo óbvio de etimologia lexical. A palavra “realidade” significa, literalmente, “plano do que é real”. Real é tudo o que existe manifestadamente, materialmente. A palavra “real” vem do latim “res”, que significa “coisa”. Portanto, Realidade é o “plano das coisas” (sejam elas materiais, químicas, físicas, energéticas ou biológicas). É o chamado universo fenomênico, das facticidades, factual, ao qual tudo tem origem, prospera e acaba. Tudo nasce, cresce e morre. É o plano da ilusão, pois nada dura. A Realidade é o “plano da res”, o “plano das coisas”, e coisa não é Ser, é ilusão. Nada mais lingüisticamente óbvio.

                             A Realidade é a MAYA dos hinduístas. É a hipocrisia dos fariseus. É condenada por não ser nada. Mas é abençoada por manifestar a Verdade e transparecer a presença “do que É” aos que também não são em si. Sem a Realidade, não teríamos como conhecer a Verdade, pois Esta é incognoscível e impenetrável. Só temos acesso à Verdade pelo que Ela se deixa revelar, ou seja, pelas coisas que Ela manifesta e cria na Realidade. A Verdade em si não tem forma para que possamos vê-la, estudá-la, etc. A forma da Verdade é Vazia. E o vazio é a forma da Verdade. Somos nós mesmos que lhe atribuímos formas, para nos comunicarmos sobre Ela e com Ela. É Ela mesma que se reveste de tais formas, para se revelar e se comunicar conosco. Dessa maneira, podemos dizer que somos feitos “à imagem e semelhança” da Verdade, mas não somos a Verdade em si.

                             Através do espelho, conhecemos a imagem da Verdade, pois olhar diretamente para a imagem nos é impossível... pertencemos ao plano especular. Através do mapa, conhecemos o desenhista, pois olhar diretamente para o desenhista nos é impossível... pertencemos ao plano do mapa desenhado. Vale frisar que esse “conhecer” trata-se de um conhecer “intelectual”, “simbológico”, “mental”, relembrando que nós, sendo também em parte espírito, em parte essência, podemos conhecer a Verdade de uma forma direta, nos livrando dos nossos instrumentos ilusórios, pelo menos por alguns momentos. Entrando em contato e comunhão espiritual, conhecemos a Verdade assim como Ela é (face a face). E esse “conhecimento” não se trata de um aprendizado “intelectual”, mas de um sentimento de “vivência”, de “plenitude”. Como disse o mestre: “Conhecereis a Verdade, e Ela vos libertará”. O ser humano é um dos raros casos no “Todo” capaz de tal proeza, pois não é inteiramente ilusão, não é inteiramente Verdade, nem inteiramente mental. É uma mistura que possui tanto uma parte espiritual (verdadeira), uma parte mental (intermediária) e uma parte corporal (real). Temos um pé em cada plano do Todo. Fomos criados, por amor, dotados tanto de espírito quanto de alma e corpo.

(Continua...)

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